A flor do Palhaço


No escritório frio, um homem sério entra. O doutor lê algumas anotações e reconhece o nome daquele que entrou na sala. O homem não espera nada, apenas fala. O doutor sem nada entender ainda, apenas ouve. As palavras saem como a necessidade dos desesperados.
“Sou palhaço sem futuro em um mundo sem presente. Sou palhaço por que o mundo não consegue rir de si mesmo, precisa rir dos outros... Sou palhaço por que as crianças precisam ver um riso puro e então sorrir esta mesma pureza. E só se pode ser palhaço quando alguém o vê. Só se pode trazer felicidade, se houver alguém para recebê-la. Só há magia se alguém acreditar nela. Só há palhaço porque houve crianças um dia.”
O doutor surpreso e ainda estático, vê o homem se maquiando enquanto fala. Com a experiência de recriar esta outra face, o homem vai aos poucos se transformando em outro ser. Um ser mítico, um ser feito de essência.
“Palhaço não se ensina, se vive. E vivendo se aprende a ver a preciosidade de um sorriso, do brilho no olho da criança e do adulto também, porque ele também já teve olhos de criança. Ser palhaço é ser um ser misterioso, que traz a tona aquela criança que esta guardada embaixo de toda a sensatez insensata que o mundo nos dá de presente ao sermos adultos. Ser palhaço é trazer sorrisos para a alma. É fazer chover alegria enquanto o homem planta tristezas. É criar lágrimas de esperanças nos olhos secos pelo pó do mundo.”
Com a maquiagem completa, ele ainda é o homem. Ainda falta algo. Ainda falta o mais importante. Antes do nariz vermelho, são as lágrimas que surgem. E escorrem manchando aquele segundo rosto.
“Sabe por que ser palhaço é tão bom assim? Porque ele é tudo o que desejamos ser. Todos nós. Sem exceção. Até mesmo o senhor quer. Pois sem nos darmos conta, vemos na sua ingenuidade e na sua alegria todos os nossos desejos. Vemos na sua face, toda a tristeza do mundo desaparecer com um simples olhar. É assim que o homem deixa de ser homem e passar a ser criança. Ou quem sabe, passa a ser palhaço...”
Coloca o nariz. Seu verdadeiro rosto agora aparece. Abraça o doutor e sussurra.
“A vida só é vida, quando um sorriso é verdadeiro.”
Entrega-lhe uma flor, vira as costas e vai distribuir alegria para um mundo necessitado.

Aquele que fica já não é o mesmo, aquele que vai também não...

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