Ela e o mundo


Em sua casa ela era plena. Sua liberdade é limitada pelo pudor, que enquanto sozinha estiver, não terá.
De um cômodo ao outro, vai deixando roupas, como quem marca o caminho para não se perder. Doce engano, ela quer o contrário. Quer se perder dentro de si. Quer em seu recanto seguro, mostrar tudo o que escondeu durante o dia.
Naquele quarto simples, porém majestoso aos seus olhos, fica nua. Inteiramente. Não só das roupas, mas do mundo. Do sorriso falso que sustenta ao passar pela porta, do olhar que encanta os homens, do perfume suave que deixa por onde anda, das responsabilidades que leva em seus ombros, da segurança que cobre a razão. Tudo ao chão. Nua. Completamente nua.
Sua vergonha exposta. Sua timidez a flor da pele. Sua real felicidade emanando por todos os lados. Ela nua e a casa cheia dela se torna um pequeno reino onde impera soberana, onde é quem sempre sonhou.
E feliz que está, ignora o mundo, mas o mundo, malicioso que é, não a ignora.
Observa atentamente. Ele sempre observa. Sempre há alguém na janela. Olhando, cobiçando. Este, de tanto desejar o próximo, esquece de sua vida, seus sonhos, de si e se torna apenas um espectador do espetáculo alheio.

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